terça-feira, 21 de agosto de 2018

5 tipos de Fake News - 3/5) A ciência

O terceiro tipo de Fake News que abordaremos nessa série de posts, nasce dos sucessos da ciência no mundo moderno. Mandamos homens andar na Lua, partimos o átomo, curamos doenças que dizimavam milhões.

Hoje em dia, tratamos até com indiferença feitos que pareceriam milagres para nossos antepassados: você embarca aqui em São Paulo e algumas horas depois está passeando em Paris. E ainda reclama que o frango que serviram na classe econômica estava meio sem gosto...

Estamos tão acostumados com a ciência funcionar, que tendemos a acreditar que uma informação é mais verdadeira quanto mais credenciada cientificamente pareça ser. Então se um colega seu diz: "Tomo banho frio todo dia para manter o peso", você pensa que ele é meio esquisitão ou levemente masoquista. Se o mesmo colega diz: "li em um estudo feito pelo FDA que um banho frio diário emagrece", você já dá uma vacilada na sua convicção sobre as delícias da água quente (FDA é a Anvisa americana, guardadas as devidas proporções...).

E se você assiste no Youtube uma palestra de um bambambam de Harvard, com um power point cheio de gráficos "provando" que tremer de frio ajudou dezenas de gordinhos, perigas até você tentar o sacrifício. A informação é a mesma, mas conforme ela parece mais baseada na ciência a credibilidade aparente aumenta.

Essa tendência dá origem a pelo menos duas variantes das Fake News:

1) Os mentirosos sabem que as pessoas tem fé na ciência, então algumas vezes vão dizer que sua afirmação é baseada em ciência, quando não é. O estudo ou a pesquisa que citam não existe. Ou existe, mas não faz exatamente a afirmação que o mentiroso faz.

2) Os cientistas, pesquisadores, diretores de institutos e universidades tem convicções ideológicas e interesses pessoais e financeiros, como qualquer ser humano. Então, em algumas situações podem, consciente ou inconscientemente, dar uma entortadinha nos resultados de estudos e pesquisas, na direção que for mais conveniente para eles. E é claro, de vez em quando simplesmente erram.

No meio acadêmico há mecanismos para lidar com isso. Para sair numa publicação científica um artigo precisa ser revisado por outros especialistas no assunto e, uma vez público, outros cientistas geralmente tentam reproduzir o experimento, pesquisa ou estudo para confirmá-lo ou refutá-lo. O resultado de um estudo ou pesquisa é considerado preliminar até ser reproduzido de forma independente por outras pessoas ou instituições.

Porém, uma informação científica duvidosa, maliciosa ou mal verificada pode ser publicada com facilidade na Internet e acabar aparecendo nas suas redes sociais, prezado leitor. É só um sujeito gravar um vídeo no YouTube onde ele abre dizendo que é médico, pesquisador, físico ou coisa parecida (para dar credibilidade científica) e daí falar as maiores barbaridades.

É duro, mas não tem jeito. Não é só com as notícias políticas que você tem que ficar esperto. Com as científicas também. Tentar verificar a credibilidade da pessoa ou instituição que que faz a afirmação científica e usar os mesmo método que as universidades usam há muito tempo para certificar-se: o que os pares daquela pessoa - outros médicos, outros pesquisadores, outros físicos - dizem? Aquele afirmação é o consenso da comunidade científica sobre aquele assunto?

Próximo post da série: 5 tipos de fake news 4/5) Os Hackers

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terça-feira, 14 de agosto de 2018

5 tipos de Fake News - 2/5) A narrativa

Uma forma sutil de "Fake News" é, a partir de fatos verídicos, contar a história de um jeito - criar uma narrativa - que leve as pessoas a imaginar o que aconteceu de acordo com os interesses de quem está contando a história. Embora os fatos propriamente ditos possam não ser fake-falsos, a tentativa de direcionar as opiniões sobre eles coloca algumas narrativas dentro do fenômeno geral de Fake News.

Inventar um fato que não aconteceu, uma mentira e publicar na Internet - como descrevemos no primeiro post desta série - é uma forma mais simplista de agir e mais fácil de ser percebida ou checada do que a Fake de narrativa, que vamos descrever a seguir.

A arte de construir uma história
A Fake News de narrativa se manifesta basicamente de duas formas, normalmente usadas em conjunto. Primeiro com uma cuidadosa escolha de partes da verdade: se alguém contar só as coisas ruins que você fez na vida - as pisadas na bola, os enganos, as decisões questionáveis, aquelas vezes que você perdeu a cabeça - o ouvinte vai ficar com uma péssima opinião a seu respeito. Se se contar só as coisas boas - realizações profissionais ou pessoais - a opinião do ouvinte será outra, embora nos dois casos só se conte fatos reais. Essa curadoria tendenciosa pode ser feita contra (ou a favor) de pessoas físicas ou jurídicas e instituições públicas ou privadas.

Segundo, uma cuidadosa escolha das palavras com que se vai descrever a verdade que está sendo contada: se eu disser que você "deu um tapinha no bumbum do seu filho sapeca" parece uma coisa, se eu disser que você "foi violento com uma criança indefesa" parece outra.

A verdade na mesa de edição
A Fake News de narrativa talvez seja a forma mais comum de se tentar manipular uma audiência e não é uma novidade da Internet. Embelezar ou enfeiar os fatos acontece desde que os homens da caverna contavam histórias em volta da fogueira. Porém, a Internet acrescentou alguns graus de perniciosidade a essa prática: é muito fácil qualquer pessoa editar um vídeo ou texto real para uma versão mais adequada à uma narrativa.

Por exemplo, recortar de um debate na TV só os momentos do debate em que o político que a pessoa apoia foi bem, ou os momentos que o político que ela desaprova foi mal. Também é muito fácil distribuir essa versão para muitas outras pessoas via redes sociais de forma anônima ou quase, diminuindo a possibilidade de responsabilização do autor.

Extra! Extra!
A Internet é uma grande guerra por atenção. Com as gigantescas quantidades de conteúdo que são publicadas todos os dias, muitos produtores de conteúdo recorrem ao sensacionalismo para tentar atrair a atenção. Um link moderado tem menos chance de ser clicado (e até de ser visto) que um mais carregado nas tintas, então as narrativas vão ficando com menos nuance. Entre "Candidato X expõe suas diferenças em entrevista" e "Candidato X arrasa com adversários em entrevista bomba", muita gente vai cair na isca e clicar na segunda chamada.

Com tudo isso, além de mentiras propriamente ditas, você vai encontrar na Internet muitas versões  - narrativas - que contam só um lado da história e de forma exagerada, que podem não ser ao pé da letra totalmente fake - falsas, mas sua distorção da verdade - escolher partes dela e o jeito tendencioso de contar - permite as incluir conceitualmente no fenômeno geral das Fake News.

Próximo post da série: 5 tipos de fake news - 3/5) A Ciência

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quarta-feira, 8 de agosto de 2018

5 tipos de Fake News - 1/5) A falsa mesmo

Neste e nos próximos posts deste blog vamos abordar o fenômeno das Fake News. Embora a tradução de Fake News seja notícia falsa, acreditamos que junto com as notícias inventadas poderíamos colocar algumas outras maneiras de distorcer o conteúdo ou a distribuição das notícias na Internet, e chamá-las também de "Fake News". Vamos lá:

Fake News tipo 1 - A falsa mesmo
A mentira não é uma invenção da Internet. Provavelmente começou junto com a fala... O que a Internet inovou foi na possibilidade do mentiroso atingir uma audiência maior, gigante até. Pré-Internet você podia contar uma história inventada para uma meia dúzia de amigos. Se ela fosse especialmente picante ou curiosa pode ser que cada um deles repassasse pra mais outra meia dúzia.

Com as redes sociais, uma publicação pode viralizar (ficar popular e ser muito compartilhada, espalhar-se como um vírus) e atingir milhões de pessoas. E nada controla de antemão se o que você vai publicar na Internet  é verdadeiro ou falso, as pessoas podem publicar o que elas bem quiserem. 

Por um lado, essa facilidade de publicação na Internet é um triunfo da liberdade de expressão. As pessoas podem comunicar ao mundo o que pensam e acreditam, sem censura ou aprovação prévia por ninguém. Por outro lado, essa mesma liberdade permite que se espalhem informações mentirosas que podem ser muito danosas às pessoas ou instituições, ou à própria sociedade como um todo.

Adoçante no café não dá câncer
Um exemplo do que uma fake news pode causar, é a mentira que algumas vacinas podem provocar autismo, que se espalhou pelas redes sociais. É possível que pais tenham acreditado e deixado de vacinar as crianças. 

Não podemos afirmar que estes boatos sobre as vacinas que circulam na Internet foram a única causa, mas a Poliomelite e o Sarampo, que eram doenças controladas no Brasil, voltaram com força. É provável que outras causas, econômicas e estruturais façam parte do problema, mas com certeza não ajuda ninguém um pai ler na Internet a mentira que vacina pode prejudicar seu filho.

Quem vigia os vigilantes?
Dado o dano que notícias falsas - as fake news propriamente ditas - podem causar, as redes sociais tem tentado controlar sua publicação e divulgação, mas não é fácil. Não há tecnologia infalível para um computador diferenciar uma informação verdadeira de uma falsa. 

Por conta disso, algumas redes sociais tem tentado passar a verificação de notícias para pessoas: os próprios usuários da rede, os funcionários das empresas donas das redes sociais ou instituições, como ONGs verificadoras. Infelizmente, isso também não está funcionando muito bem.

Primeiro porque ninguém tem um grupo de pessoas grande o suficiente para checar manualmente os bilhões de informações que são publicados diariamente. Os computadores podem sim checar bilhões de informações, mas a partir de critérios estabelecidos por seus programadores nos algoritmos (procedimentos que seguem automaticamente regras pré-programadas). 

Ou seja, na checagem individual manual de uma informação, ou na checagem automatizada em grandes quantidades feita por algoritmos, quem decide ou que é verdadeiro ou falso são pessoas. E em ambos os casos já há acusações que os verificadores humanos  estariam sendo tendenciosos e marcando como verdadeiras as notícias que os agradam e como falsas as notícias que os desagradam. 

Por exemplo, teriam marcado como verdadeiras as notícias que mostravam pontos positivos de um político ou causa que o verificador apoiava e marcado como falsas as notícias que mostravam pontos negativos. A tecnologia avança, mas a natureza humana permanece a mesma....

É cada um por si
Tudo leva a crer que, pelo futuro previsível não haverá solução completa, nem baseada em tecnologia nem baseada em gente, para o problema de mentiras circulando pela Internet. Você vai ter que aprender a se defender por conta própria.

Próximo post da série: 5 tipos de Fake News - 2/5) A narrativa

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