quinta-feira, 13 de abril de 2023

A Internet precisa de controle de conteúdo. Urgente.


Depois do recente caso do adolescente que matou uma professora a facadas, a imprensa denunciou que há muitas postagens e perfis na Internet que louvam e promovem esse tipo de ataque em escolas. Essa é só uma ponta do iceberg de conteúdos nocivos na Internet. O problema é muito pior.

O horror

Vários estudos mostram que as crianças estão começando a acessar pornografia explícita na Internet aos 8 ou 9 anos de idade. Aos 11, cerca de um terço das crianças já acessou.

Também são fáceis de encontrar na Internet publicações que encorajam violência, vandalismo, comportamentos perigosos ou danosos, ódio a pessoas ou grupos, as já citadas promoções de ataque em escolas e muitos outros conteúdos nocivos.

E fake news então? Todo dia vejo nas redes sociais publicações mentirosas. Algumas toscas, só uma pessoa radicalizada de direita ou de esquerda acreditaria,  mas outras, são super bem feitas para deliberadamente induzir o público ao erro.

Em resumo, na Internet de hoje, qualquer insano, mal-intencionado ou criminoso publica o que bem quiser e qualquer pessoa, inclusive crianças e adultos mentalmente frágeis, ou desiquilibrados, acessa o que bem quiser. Os controles, quando existem, beiram o deboche, como um botão "clique aqui para sair se for menor de 18 anos..." 

As ferramentas da democracia, governos, judiciário, polícias, tentam conter os casos mais graves. Mas os mecanismos da democracia foram criados para lidar com problemas anteriores à Internet, não tem capacidade, nem velocidade, para lidar com bilhões de publicações. 

Além disso, a própria legislação que hoje baseia as ações de controle não está preparada para todos os problemas novos, específicos da Internet. Por exemplo, o fato que qualquer indivíduo possa ter uma audiência igual ou maior que a de um canal de televisão.

Mas as redes sociais não excluem conteúdos danosos ou perigosos?

Várias redes sociais têm auto regulamentação, isto é, tem mecanismos para excluir conteúdos que, na opinião delas, são nocivos. Geralmente uma combinação de filtros pré estabelecidos pelos programadores e a possibilidade de usuários denunciarem o conteúdo de outros usuários.

Agora reflita comigo, prezada leitora, prezado leitor. Uma grande indústria de alimentos pode até se auto regulamentar para evitar alguns problemas com a comida que vende, mas vai de própria iniciativa retirar do mercado  todos os salgadinhos que lhe dão lucro, porque eles têm muita gordura e sal? Vai de própria iniciativa colocar, no seu chocolate mais vendido, um rótulo bem assustador avisando que consumo continuado de açúcar pode levar ao diabetes? 

Claro que não. No mundo inteiro é preciso os governos regulamentarem os teores máximos e mínimos de alguns ingredientes, proibir alguns conservantes e aditivos químicos, estabelecer qual informação nutricional é obrigatória nos rótulos e muitas outras regras. Isso previamente, além de mecanismos de fiscalizar, denunciar, proibir e punir, para os casos que escaparem dessa rede de segurança prévia.

Um paralelo com a indústria alimentícia se aplica à Internet. A auto regulamentação na Internet pode até segurar alguns exageros, mas hoje é feita de acordo com as possíveis boas intenções dos donos das empresas da Internet, não de acordo com critérios  a ser estabelecidos pelas instituições da democracia para esse fim e com força de lei.

Os algoritmos pioram o que já é ruim

A indústria alimentícia não exagera no sal, gordura, açúcar, glutamato, aromatizantes, corantes, etc. porque é vilã e quer fazer mal às pessoas. Faz porque isso leva a consumir de forma crescente o que ela vende. Obesidade, diabetes, ataque cardíaco, derrame, doença renal crônica, etc., advindos do consumo excessivo, são "só" efeitos colaterais.

Do mesmo modo, os algoritmos das redes sociais, sites e aplicativos, não oferecem conteúdo nocivo às pessoas porque as empresas são vilãs e querem fazer mal às pessoas. Fazem porque querem que consumam de forma crescente o que veiculam. Para isso, os algoritmos observam o que cada pessoa gosta de ver e vão aumentando a dose. Se você assiste vídeo de gatinho, a rede social lhe mostra mais filme de gatinho. Se assiste de acidente de carro, ela lhe mostra mais  acidente de carro.

Assim, qualquer gosto ou inclinação que a pessoa tenha, seja benigna ou seja tara, é retro alimentada pelos algoritmos, com mais e mais conteúdo relacionado. O objetivo do algoritmo é fazer as pessoas consumirem, numa espiral crescente, o conteúdo que oferece. Radicalização política, intolerância , isolamento social, violência, anorexia, automutilação, suicídio, etc. são "só" efeitos colaterais.

Para mim, os governos precisam intervir na Internet, como já fazem na indústria alimentícia. Fazer controle de conteúdo na Internet. Direto e dos algoritmos que selecionam o que é oferecido às pessoas.

Controle não é censura?

Na democracia nenhuma liberdade ou direito é absoluto, todos são regrados. Eu tenho o direito de ir e vir, mas se eu passar no farol vermelho a polícia pode me parar. Eu tenho liberdade de expressão, mas se eu ameaçar você de morte posso ir preso. Eu tenho o direito de comprar um revólver, mas tenho que ter 21 anos ou mais, de idade. Nada disso é ditadura, é o funcionamento normal da democracia. 

Assim, os governos criarem regras para o direito de publicar e acessar conteúdo na Internet, é tão normal e democrático quanto as regras que já existem para todo os outros direitos e atividades.

Chamar de censura qualquer tipo de controle de conteúdo na Internet é uma tentativa maldosa de associar uma salvaguarda sadia da democracia com uma prática perversa das ditaduras - calar os adversários. 

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hoje, qualquer maluco ou criminoso publica o que quiser e qualquer pessoa, inclusive crianças e adultos mentalmente desiquilibrados, acessa o que quiser
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Controle de conteúdo da Internet é para a democracia decidir o que pode ou não pode na Internet, assim como decide o que pode ou não pode nas ruas.

Eu não disse que é fácil

Mas saiba, prezada leitora, prezado leitor, que eu achar que é necessário maior controle de conteúdo na Internet, não significa que eu ache isso fácil. Nem de longe.

Primeiro, tem o problemão político: nos exemplos mais óbvios, criança de 8 anos acessar filme de sexo explícito, ou influenciador com milhões de seguidores dizer que gostaria que alguém desse um tiro no presidente, fica fácil ver o risco. Mas há muitos casos que não são tão claros. Pode ser difícil decidir o que é saudável e o que é nocivo para a sociedade, bem como nos casos nocivos, é difícil decidir até onde vai o direito das pessoas voluntariamente envenenarem a si mesmas e aos outros.

Então, o que pode e o que não pode na Internet? Quem decide isso? Como se faz para evitar  que quem decide use esse poder para seus interesses pessoais ou políticos (para calar os contrários, por exemplo)? 

Segundo, tem o problemão técnico: quando a Internet foi criada, não se imaginava que ela se tornaria  fundamental para a sociedade. Então, uma série de controles e seguranças não foram embutidos na sua estrutura básica. Por exemplo, não há checagem de identidade, nativa da Internet. Pelo contrário, a Internet estimula o anonimato e até a ocultação deliberada da identidade de quem publica ou acessa.  

Ainda na questão técnica, o gigante volume de publicação na Internet é maior do que pessoas seriam capazes de verificar manualmente. Qualquer forma de filtragem tem que ser automatizada. Porém, nem sempre a Inteligência Artificial consegue reconhecer problemas que humanos reconhecem.

Conclusão

Nenhuma sociedade civilizada deixa de enfrentar o crime, ou os acidentes de trânsito, só porque são problemas difíceis e para os quais não há soluções, só paliativos. 

Na minha opinião, o controle da publicação e acesso na Internet de conteúdos nocivos, danosos ou perigosos cai nessa mesma categoria. Não há "solução", mas enfrentar o problema pode diminui-lo.

Me parece que esse enfrentamento passa por estabelecer entidades que envolvam a sociedade e governos, na forma de agências governamentais, porém autônomas. Criar uma "Anvisa" + "Vigilância Sanitária" da Internet. A ideia de uma Agência se baseia em dois motivos principais: 

1) as regras de conteúdo da Internet tem que ser dinâmicas, serem continuamente ajustadas a mudanças na sociedade e na cultura. Não dá pra supor que uma lei feita de uma vez só preveja tudo. 
2) As regras de conteúdo têm que se manter razoavelmente isentas de contaminações ideológicas ou partidárias mais radicais, ou da posição do governo da vez. Como a gente viu no caso do enfrentamento da pandemia da Covid pela Anvisa, ou do enfrentamento da inflação pelo Banco Central, é possível construir entidades governamentais com uma certa isenção ideológica e partidária.

Também é preciso estabelecer legislação que permita às democracias forçarem as redes sociais, sites e aplicativos seguirem o que for estabelecido pelas Agências. Na democracia, todos respondem civil e criminalmente pelo jeito com que ganham dinheiro. As empresas de Internet não podem ser exceção.

Quanto às dificuldades tecnológicas, com pressão da sociedade e punições dos governos, estou tranquilo que as empresas encontrem as tecnologias. Já aconteceu em outras indústrias, como na automobilística. Pressionada, aumentou tremendamente a segurança dos carros, ao longo do tempo.

Eu sou otimista na capacidade da humanidade de resolver problemas. Mas para isso, é preciso que haja a vontade. Espero que este post dê a minha pequeníssima contribuição, para crescer na sociedade a vontade de mais controle de conteúdo na Internet, 

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